O ecossistema de startups no Brasil amadureceu o suficiente para que possamos revisitar trajetórias como a de Alex Tabor e entendê-las não como exceções, mas como responsáveis por marcos que fundamentaram o amadurecimento desse ecossistema.
Co-fundador do Peixe Urbano, um dos primeiros negócios digitais a escalar no país, Alex agora lidera a Tuna Pagamentos, fintech especializada na orquestração e performance dos pagamentos online.
A conversa que tive com ele revela mais do que a trajetória profissional: mostra como se forma uma visão estratégica em quem conseguiu atravessar diversas fases do mercado digital, do boom das pontocom ao atual cenário fintech. Com experiências que vão da criação de um MVP sem nenhum investidor ao fechamento de rodadas com gigantes como ABSeed, Alex hoje volta ao core da jornada com a Tuna, empresa que fechou 2024 com R$3,8 bilhões em volume processado e mira um TPV de R$11 bilhões para 2025.
Nesse papo de founder, vamos explorar a jornada de Alex, o modelo de negócios da Tuna, os desafios de captação e crescimento e a sua visão sobre o papel do CEO.
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Das linhas de código aos grandes deals
Alex é um caso raro de fundador que mistura a fluência técnica de quem programa desde os seis anos com a visão de negócios observando o movimento do início dos anos 2000 no Vale do Silício. Com cidadanias brasileira e americana, cresceu na Ásia estudando em escolas americanas, o que lhe deu um repertório multicultural e um raciocínio global desde cedo.
Entrou na Universidade do Sul da Califórnia no auge da bolha pontocom, e viu, ainda na faculdade, o mercado de venture capital desidratar após os excessos do fim dos anos 1990. Esse baque o fez repensar seu plano original de entrar direto em uma startup no Vale e, numa conversa com Paulo Guedes, ouviu o que viria a ser um turning point: “Por que não empreender no Brasil?”
Foi o que fez. Fundou sua primeira empresa de software no Rio de Janeiro, vendendo serviços para os EUA e Reino Unido. Depois, passou pela Power.com onde liderou iniciativas que hoje são obrigatórias para qualquer produto digital escalável, como arquitetura distribuída, entregabilidade de e-mails em massa e uso pioneiro de AWS ainda em beta. Mas foi com o Peixe Urbano que Alex entrou de vez para a história do empreendedorismo digital no Brasil.
O impacto do Peixe Urbano: MVP com a mãe do sócio comprando o primeiro cupom
O Peixe Urbano nasceu num modelo quase experimental: Alex e Júlio Vasconcellos colocaram no ar uma landing page com a promessa de cupons com até 90% de desconto em serviços locais. A primeira venda foi para a mãe do Júlio. Mas o que parecia apenas um apoio familiar virou um insight: mais da metade dos primeiros 50 cupons vendidos foram para pessoas desconhecidas, captadas via Google.
O modelo tracionou, captou com os maiores fundos do mundo, incluindo Morgan Stanley e T. Rowe Price e formou um time técnico que seria, anos depois, a gênese da Tuna. A experiência também mostrou o peso estratégico da infraestrutura de pagamentos. Ao tentar terceirizar o antifraude do Peixe Urbano, Alex viu que os players disponíveis não entregavam a performance necessária e, pior, geravam falsos positivos que drenavam a receita.
Dali surgiu o embrião da Tuna: um software interno que orquestrava regras antifraude, testava provedores em paralelo e fazia micro-otimizações que geraram até 15% de aumento no faturamento em apenas dois meses.
A Tuna: de solução interna a fintech de alta performance
A Tuna nasce com um produto claro: substituir a caixa preta dos gateways tradicionais por uma plataforma de orquestração de pagamentos online com lógica no-code, testes A/B e inteligência antifraude. O produto é técnico, mas o benefício é tangível: aumentar taxa de aprovação, reduzir chargeback e otimizar conversão no funil de pagamento.
Os resultados de mercado não demoram a aparecer. Com clientes como Zé Delivery, ClickBus, AnotaAI, Riachuelo e Arezzo, a Tuna fechou 2024 com R$3,8 bilhões em volume processado e um faturamento de R$19 milhões, mais do que o triplo do ano anterior. A empresa atende 42 mil clientes ativos mensalmente, majoritariamente por meio de marketplaces.
Além disso, sua capacidade de melhorar performance é comprovada com cases reais: aumento de 19% na aprovação de pagamentos com a Arezzo, mais de 20% com a Trocafone e reduções de até 70% no custo com antifraude em alguns supermercados.
Investimento como alavanca: da sobrevivência ao crescimento com tração
A Tuna não escapou dos percalços que toda startup enfrenta na fase de consolidação. Após levantar com fundos como Canary e Atlântico (do Julio Vasconcellos) para construir o produto, enfrentou o período mais crítico entre 2021 e 2022, quando o mercado endureceu os critérios e exigia tração real.
Alex precisou fazer cortes e estender o runway, algo que ele admite ter aprendido com sua trajetória anterior. “A primeira prioridade é a manutenção do negócio. Se o caixa acaba, acaba o jogo.” A estratégia deu certo. Com a máquina de vendas validada em verticais como moda, mobilidade e alimentação, a Tuna levantou um novo aporte com a ABSeed.
O plano agora é claro: estruturar a rodada Série A em 2025 para ampliar o time comercial, integrar-se a plataformas como Shopify, Oracle e Salesforce, e dobrar o TPV em um ano.
A visão do CEO: papel que ninguém pode terceirizar
Na etapa final da nossa conversa, perguntei o que ele considera ser o verdadeiro papel de um CEO de startup. A resposta veio com a precisão de quem já viveu todas as fases de uma empresa, da ideia no papel à venda de bilhões:
“O CEO é responsável por fazer o projeto decolar. Isso significa contratar bem, alinhar o time, definir o ritmo de execução e calibrar o uso do capital. Mas, acima de tudo, significa testar o mais rápido possível o que está sendo desenvolvido. O pior desperdício é construir algo que não será útil.”
Alex ainda reforça a importância de entender profundamente o mercado e seus canais. Um bom produto sem um canal eficiente é apenas uma ideia mal aproveitada. Além disso, lembra que a captação de investimento exige mais do que uma boa tese — é preciso mostrar tração real, capacidade de escala e margens que sustentem o crescimento.
O que podemos aprender com Alex?
A maturidade de um fundador não está na idade, mas na experiência acumulada com diferentes ciclos. Alex já foi engenheiro, CTO e CEO. Já fundou empresas de serviço, produto, plataforma. Sabe quando pisar no acelerador e quando é hora de cortar custos para sobreviver.
A Tuna é um produto que nasce de uma dor real, validada na prática, e que resolve um problema complexo com simplicidade. A orquestração de pagamentos não é glamour, mas é alavanca direta de receita.
Fundadores com experiência em ciclos anteriores têm um diferencial na hora de captar investimento. Não pela fama, mas porque sabem defender o negócio, o mercado e o plano de expansão com profundidade.
O maior risco é construir no escuro. CEOs precisam estar obcecados por validação rápida, eficiente e orientada a resultados. No fim, não é sobre fazer bonito para investidor, é sobre construir um negócio que gera valor real.
A Tuna está longe de ser apenas mais uma fintech. Ela é, hoje, um exemplo de como resolver problemas estruturais com estratégia, execução e consistência. E como diz o próprio Alex, talvez o maior aprendizado de sua jornada seja este: “A startup só continua viva se não cair no precipício e runway é tudo.”
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— Luiz
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