Dormir bem não é luxo, é saúde.
Ainda assim, milhões de pessoas no Brasil enfrentam dificuldades para conseguir um diagnóstico adequado de distúrbios do sono. Esse problema, negligenciado por décadas, foi o ponto de partida para a trajetória de Talita Salles, fisioterapeuta e educadora física, que se especializou em medicina do sono quando o tema ainda era desconhecido por aqui.
Talita não apenas estudou o assunto, ela viveu. Viu seu pai sofrer com apneia não diagnosticada, enfrentou a frustração de tentar oferecer cuidado adequado e percebeu que boa parte do sistema de saúde não estava preparado para lidar com essa demanda. Trabalhou por mais de uma década na multinacional Philips, onde lidava com diagnóstico e tratamento da apneia do sono em escala latino-americana. Era um desafio constante: alto custo, complexidade logística e tecnologia pouco acessível.
Talita Salles e sua experiência empreendedora
Quando sentiu que precisava empreender, Talita não foi em busca de uma "oportunidade genérica". Ela queria resolver uma dor que carregava há anos. Foi nesse momento que conheceu a Biologix ainda pequena, com menos de 10 pessoas, desenvolvendo um sensor para monitoramento de sono. O encontro foi imediato. Talita viu ali o potencial de aplicar toda a sua bagagem técnica em um produto com propósito claro: democratizar o acesso ao diagnóstico da apneia do sono.
Desde o início, ela esteve na linha de frente: estruturou a área comercial, liderou marketing, treinou o time de vendas e acompanhou pessoalmente os primeiros passos da operação. Tudo isso sem abandonar a visão clínica. Seu papel era (e ainda é) conectar o que o mercado precisa com o que a tecnologia pode oferecer.
Ela aprendeu a liderar pessoas na prática, com o time crescendo junto com a empresa. E mesmo depois de estruturar a operação e contratar lideranças mais experientes, Talita continua próxima: nos eventos, nas negociações, nos problemas críticos. “Se eu puder destravar uma venda ou resolver uma dúvida técnica, eu entro. Mas o time tem autonomia. A ideia é empoderar e acompanhar.”
Essa presença constante não é centralizadora é uma forma de manter o ritmo, o padrão de qualidade e o foco. E isso, mais do que qualquer teoria de liderança, é o que diferencia quem constrói negócios que duram.
A Biologix como startup de software e hardware
A Biologix não é apenas uma empresa com um bom produto. Ela é uma healthtech com um modelo ousado: fabricar hardware no Brasil, com tecnologia própria, e fazer isso com escalabilidade. O exame do sono da Biologix validado pelo InCor e com certificações dos principais órgãos reguladores é feito com um oxímetro de alta sensibilidade conectado a um app. Os dados são processados por inteligência artificial e enviados para a nuvem. O paciente faz o exame em casa. O profissional de saúde acompanha tudo com facilidade.
Hoje, são mais de 14 mil exames realizados por mês, com mais de 5.000 clientes ativos, entre clínicas, hospitais e consultórios. A estimativa é que metade dos exames de apneia realizados no Brasil já passem pela Biologix. E tudo isso sem depender de importações. A empresa fabrica no país mesmo enfrentando os desafios regulatórios da Anvisa e da indústria nacional. “Seria mais fácil importar, mas não estaríamos resolvendo o problema real do acesso”, afirma Talita.
Esse compromisso também se reflete no modelo de negócio: B2B2C, com foco em profissionais de saúde que usam a tecnologia da Biologix para atender seus próprios pacientes. Isso gerou uma base de dados imensa e um efeito de rede que sustenta o crescimento da empresa sem depender de grandes estruturas comerciais.
Na parte financeira, a Biologix opera com responsabilidade. Chegou ao breakeven antes de captar novamente e só levantou recursos quando tinha clareza do próximo passo. O investimento mais recente, de R$ 6 milhões, veio da Kortex Ventures, fundo ligado ao Bradesco e ao Sabin. Mais do que o dinheiro, a escolha foi feita pela capacidade de abrir portas, trazer inteligência de mercado e impulsionar a estratégia de longo prazo.
Talita viveu todas as fases de captação: dos pitches cansativos às propostas desalinhadas. E fez questão de manter o foco: “A gente já tem uma empresa que funciona. Não vamos abrir mão disso por condições que não façam sentido.” Esse tipo de maturidade é raro. E, hoje, se traduz em decisões estratégicas mais sólidas, capacidade de negociação e alinhamento com o propósito.
A Biologix segue em expansão: já exporta para o Chile e Argentina, amplia sua rede de clínicas credenciadas e lança novos produtos em 2025. Ao mesmo tempo, reforça seu posicionamento como referência nacional em medicina do sono. Tudo isso com um time que cresceu junto e com uma fundadora que segue conectada à base do negócio.
A história da Biologix e de Talita Salles é, ao mesmo tempo, inspiração e manual prático para quem está fundando uma startup. Mostra que conhecimento técnico profundo, estratégia bem estruturada e liderança com propósito podem construir algo relevante mesmo em setores altamente regulados e desafiadores como a saúde.
O que essa jornada revela, no fim, é que crescimento de verdade não acontece só com pitch bonito. Acontece com produto validado, equipe comprometida, cliente atendido com consistência e decisões estratégicas que respeitam a visão de longo prazo.
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Nos encontramos por aqui na próxima segunda
— Luiz.
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