Se você já sentiu na pele a dificuldade de contratar gente boa — sobretudo desenvolvedoras(es) — vai se reconhecer na história de Erika Pelaez. Nordestina, administradora com 13 anos de experiência em RH e hoje CEO da Lovel.
Ela transformou a dor de preencher vagas técnicas em uma plataforma que une inteligência artificial e uma comunidade de recrutadores. Em três anos, saiu do “Frankenstein de planilhas” para ser listada entre as Top 4 HR Techs de recrutamento no 100 Open Startups, captar com o Google for Startups sem diluir equity e mirar expansão internacional.
Tudo isso sem perder o propósito de empoderar profissionais de RH e aumentar a diversidade no ecossistema. Conheça, nos tópicos a seguir, o passo‑a‑passo que qualquer founder pode adaptar.
Comece por uma dor que é sua
Erika viveu, como gestora de recrutamento em fintechs e indústrias, o gap entre demanda e oferta de talentos tech: o Brasil precisará de 790 mil profissionais até 2025, mas forma apenas 50 mil por ano. Sentar‑se “dos dois lados do balcão” — ela como RH e o sócio (e marido) como gestor de tecnologia com a cadeira vazia — foi o insight que originou a Lovel. A primeira lição é clara: problemas que você sente de perto fornecem a cola emocional para persistir quando os obstáculos surgem.
A startup não nasceu com plataforma polida. “A Lovel começou Frankenstein, peça de cada lado, porque feito é melhor que perfeito”, conta a fundadora. Essa mentalidade permitiu entrar no mercado antes dos concorrentes e validar hipóteses na prática, economizando capital. Só depois de comprovar tração veio o investimento em tecnologia própria e IA. Construa valor primeiro; lapide depois.
Enquanto muitos players são só ATS ou só consultorias, a Lovel escolheu o meio‑termo:
Marketplace de recrutadores (“o Uber do recrutamento”) — cada vaga vai para dezenas de hunters especialistas, multiplicando alcance.
IA de matching — filtra perfis, prioriza diversidade e libera o recrutador para a parte humana da entrevista.
Empresas ganham agilidade; recrutadores ganham renda extra e treinamento gratuito; candidatos recebem uma experiência personalizadas. Se o seu modelo cria valor para todos os lados, reduz resistência competitiva.
Estratégia de mercado
Focar em tech talent deu identidade clara e permitiu aproveitar a escassez global de desenvolvedores. Ao mesmo tempo, a oferta é remota, abrindo portas para clientes internacionais já no ano 3. Escolha um nicho crítico onde você possa ser “melhor do mundo” e construa processos que se repitam em escala.
Erika admite ter “perdido o timing” da primeira rodada — mas isso forçou disciplina: o fluxo de caixa dos 65 clientes ativos financiou a operação. O Google for Startups trouxe depois dinheiro, conexões de engenharia e carimbo de credibilidade sem diluição. Aprendizados:
Governança e métricas na ponta da língua — cada entrevista do processo seletivo do Google exigiu dados de produto, cultura e finanças.
Cap table limpa vale ouro — equity‑free mantém espaço para uma rodada maior (e melhor avaliada) no futuro.
Investidor é parceiro pós‑cheque — programas que abrem portas e aceleram networking encurtam o caminho até a próxima fase.
Captação 2.0: escolha do “segundo casamento”
Com base no selo Google, a Lovel se prepara para uma rodada dilutiva focada em:
Internacionalização estruturada
Lançamento de novos produtos adjacentes
Possíveis aquisições de ATS para consolidar mercado
Erika procura investidores que tragam sinergia operacional e visão de longo prazo. A recomendação para outros founders: tese de fundo > cheque; o pós‑investimento é onde o valor se materializa ou se perde.
Direcionar e intermediar
A CEO define seu papel em duas palavras: direcionar (estratégia, cultura, produto, vendas) e intermediar (clientes, time, investidores). Para isso:
Transparência interna: compartilhar metas e desafios fortalece engajamento.
Princípio “30 % é o meu 100 % nos dias ruins”: reconhecer limites preserva saúde mental.
Diversidade como pilar: nome da empresa homenageia Ada Lovelace; a IA se chama Ada; a liderança feminina vira exemplo para outras fundadoras.
A Lovel não pretende “matar” o recrutador — pelo contrário. A IA automatiza partes tediosas e libera tempo para empatia e avaliação cultural. Para fundadores, a lição é evitar o hype vazio: construa features que ampliem o potencial humano, em vez de prometer substituir pessoas sem entregar.
Treinar profissionais de RH de fora dos grandes centros e pagar por vaga fechada cria lealdade natural. Essa comunidade torna‑se barreira de entrada: quanto mais recrutadores experts na plataforma, maior a vantagem de dados e velocidade. Pense em incentivos que transformem usuários em parceiros e defensores da marca.
Como mulher nordestina em tech, a CEO sente o dever de expor a própria jornada para ampliar referências no ecossistema. “Se é ecossistema, precisa ser plural”, lembra Luiz Gomes na entrevista. Empresas fundadas hoje já devem nascer replicando essa mentalidade de inclusão em times, produtos e comunicação.
Checklist prático para outras(os) founders
Sinta a dor antes de propor a cura.
Lance um MVP funcional, mesmo imperfeito.
Busque um posicionamento híbrido que some tecnologia e fator humano.
Nicho profundo + escala global é melhor que mercado genérico.
Priorize capital inteligente (equity‑free ou fundos com tese aderente).
Construa cultura clara e cuide da saúde mental da liderança.
Use IA para empoderar pessoas, não eliminá‑las.
Comunitize usuários e parceiros: eles defendem seu produto.
Trate o investidor como parceiro de longo prazo, não como caixa‑automático.
Compartilhe sua história — diversidade gera inovação e atrai talentos.
Obrigado por ter lido essa edição da Kamelo. Cada edição é uma oportunidade para refletir sobre nossas decisões ao longo da jornada. Nos vemos por aqui na segunda, dia 21/04, com uma edição bem interessante no feriado!
Fique bem,
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